Conceitos básicos da Umbanda

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(Por MÍRIAM DE OXALÁ)

 

Conceitos básicos: 


REENCARNAÇÃO - ato de nascer novamente em novo corpo, unindo-se a esse desde sua formação no útero feminino. Devido as circunstâncias, esquecemos parcialmente do que fomos em vidas anteriores, do que fizemos, de nossos afetos e desafetos, do que nos comprometemos com nossos guias a fazer. Dizemos parcialmente porque trazemos conosco nossas lembranças íntimas, nossa índole, nossos instintos, nossas predileções, nossos dons que, sob uma análise parcial, logo temos uma clara idéia de todos os fatos anteriores à essa vida, bem como promessas feitas. Quanto mais evoluídos espiritualmente, teremos maior compreensão e lembranças do passado em nosso íntimo pela maior sensibilidade que dispomos.

PERISPÍRITOforma simplificada de conceituar o corpo semimaterial (formado a partir das energias/fluidos do mundo que iremos reencarnar e do dito plano espiritual) que agrega-se ao espírito. É com ele que o espírito costuma tornar-se visível aos médiuns videntes para ser percebido; graças a ele também é possível o espírito manifestar-se diretamente no plano físico através dos inúmeros fenômenos paranormais/mediúnicos. Esse corpo é chamado de duplo ou duplo etérico em outras escolas espiritualistas. Quanto mais evoluído for um espírito, menos denso será seu perispírito, mais plástico (pode assumir a forma que quiser pela sua maleabilidade), mais fácil e mais longe será sua locomoção. 

CORPO - invólucro do espírito, elo de ligação temporário que ele se vale para atuar diretamente no mundo de energias mais densas que chamamos mundo físico. Apesar da hereditariedade, o corpo físico é plasmado (desenvolve-se, compõe-se) ainda no corpo da mãe a partir da composição do perispírito daquele que vai nascer. Em outras palavras, o perispírito é a matriz do corpo que teremos.  

ESPÍRITO – princípio inteligente cuja formação deve-se ao Criador. Forma absolutamente imaterial e tão sutil que, para reencarnar, necessita revestir-se de um perispírito para agregar-se a um corpo físico. Para o reencarnacionista, é ele a verdadeira fonte da inteligência sendo o cérebro apenas um órgão complexo mas, ainda, apenas o órgão de um corpo. Isso explicaria a recomposição do cérebro após traumas como sua parcial destruição em acidentes porque, verdadeiramente, quem transmitiria o pensamento seria o espírito que é indestrutível e eterno. Ao ser criado, nasce “simples e ignorante” e dotado de “livre arbítrio”; ou seja, para evoluir terá de adquirir experiência através de inúmeras reencarnações e, ao mesmo tempo, terá a possibilidade de escolher seu próprio caminho não sendo jamais dirigido mas, eventualmente, aconselhado pela sua própria consciência ou pelas entidades superiores. Esse estado primeiro, quando ainda não temos sabedoria plena no processo de evolução do nada à angelitude infinita, praticamos atos por ignorância ou mesmo tentando burlar as leis universais de Deus crendo ser isto possível: o livre-arbítrio utilizado sem critérios (eis o que convencionou-se chamar “mal”) produz uma reação de igual força contrária que conduz ao repensar, ao retorno às leis naturais. Todos os seres vivos, desde a pedra até os anjos, passam pelas reencarnações até chegar próximo a perfeição (impossível chegar-se até ela, já que somente Deus é perfeito); assim os minerais, animais, plantas evoluirão tornando-se homens que, muito além, serão um dia anjos. Não necessariamente, portanto, para se ser um espírito, o indivíduo precisará ter morrido. Concomitantemente, há aqueles que já morreram e dessa forma estão desprovidos de corpo físico: chamamos simplesmente de espíritos, desencarnados, mortos. Ã categoria dos que estão utilizando-se temporariamente de um corpo chamamos de vivos, reencarnados

MAL para o espiritualista, para o reencarnacionista (inclusive os umbandistas) o mal não existe. Sendo Deus perfeito, obviamente não poderia ter criado algo tão imperfeito como o próprio mal. Seria apenas um estado temporário, fruto da ignorância das leis naturais pelos indivíduos na tentativa de burlá-las ou, ainda, atuação da Natureza com fins de sua renovação vista por nós como algo maléfico (erupções, temporais, enchentes, etc.). Aliás, o mal é apenas uma questão nossa de ponto de vista: quando um mundo de extingue poderá ser um mal para seus habitantes; para Deus seria a transformação da matéria envelhecida por um mundo novo, mais aperfeiçoado. Para regular automaticamente tais atitudes nossas e de seu Universo, Deus criou a lei universal de Ação e Reação: à toda ação nossa ou de sua Obra, num todo, corresponderá uma reação de igual intensidade contrária. Assim, todo o Universo (inclusive nós) se auto-regula. 

RESSURREIÇÀO ato de voltar à vida no mesmo corpo, após sua morte. Não confundir-se com catalepsia ou letargia, doença atribuída ao caso de Lázaro, acordado pelo magnetismo extraordinário que dispunha Jesus. É um conceito impreciso pela incompreensão médica da época, bem como interpretação posterior dos textos bíblicos. 

FLUIDOS termo adotado por Allan Kardec para designar, em sua época, a mistura de energias que transformam-se umas nas outras e decompõe-se em escala quase infinita desde aquelas que usamos diariamente em nosso plano físico (energia solar, calorífica, elétrica, etc.) até aquelas não detectadas ainda por instrumentação de laboratório chamadas, vulgarmente, de “espirituais”. Em nosso trabalho, preferimos adotar o termo “energia” em vez de fluidos para designar a mesma coisa.

MUNDO MATERIAL, PLANO FÍSICO –Chamamos assim tudo aquilo que é captado pelos nossos cinco sentidos. De enormes limitações (basta conhecer a sensibilidade do ouvido e sentidos dos animais), seria apenas energia condensada de pouca durabilidade, pouco plástica, muito limitada em relação às ditas espirituais.

MUNDO ESPIRITUAL tudo aquilo que pertence ao grupo de objetos, seres, energias que não são captáveis pelos nossos sentidos ou mensuráveis pelos nossos instrumentos. Tem uma graduação quase infinita desde os mais densos (mais materiais ou parecidos com esse plano) até os mais sutis, (imperceptíveis até pelos médiuns sensitivos) mais adestrados.

DIABO Demônio, Satanás ou o nome que lhe dêem as diferentes bibliografias, como indivíduo ou “anjo decaído” não existe, condenado ao fogo eterno e terrível rival de Deus que, em muitas vezes, iguala-se em poder. Trata-se apenas de um nome coletivo para designar as vastas falanges de espíritos revoltados, incapazes de compreender as leis naturais (sendo assim, divinas), embrutecidos em sua própria ignorância ou uma alegoria da dualidade existente entre espírito/matéria. Deus, sendo perfeito, não poderia criar ser tão imperfeito e, sem piedade, condená-lo ao fogo eterno sem volta (lembramos a “Parábola do Filho Pródigo” aonde Jesus tenta explicar que o Criador é infinitamente piedoso e espera pacientemente pelo amadurecimento de seus filhos, bem como seu retorno à razão). Na figura do Diabo, como ser único, centralizamos nele nosso estado temporário de ignorância, apego demasiado aos instintos em detrimento à inteligência, apego à matéria como se fosse a única forma de energia que existe, nossa infantil tentativa de escapar e ser mais espertos do que o Criador burlando-lhe suas leis igualmente perfeitas. Se um homem tem piedade de seus filhos, o quão será Deus em sua misericórdia conosco; como poderia, então, Ele ser tão pequeno de alma e condenar um filho à impiedade eterna? Ou ter um rival de igual poder, disputando-lhe a soberania? Teríamos então dois deuses em vez de um?  

INFERNO, CÉU – são os locais descritos pelas entidades, por intuição de médiuns, ou mesmo através dos sonhos em visita às regiões para aonde os espíritos vão após a morte relatados por todas as religiões, em todos os tempos. Essas regiões, construídas e delimitadas pelas mentes superiores servem para abrigar os espíritos em seus mais diferentes graus de compreensão e aperfeiçoamento moral. As regiões infernais, como lugar de penitência eterna não existem para o espiritualista/reencarnacionista que vê Deus como um ser infinitamente bom, sábio e misericordioso desejando que seus filhos possam evoluir e serem felizes como toda a sua Criação. Prefere-se os termos Purgatório, Umbral, Maus Caminhos (Ona Buruku) para designar as regiões sombrias; Céu, Colônias Espirituais ou Aruanda para designar as regiões de trabalho e progresso pois, ociosidade, não faz parte de qualquer princípio evolutivo. Fala-se que as regiões sombrias, até mesmo pela sua baixa densidade vibratória, está muito próxima ao orbe terrestre de matéria igualmente densa. 

QUIMBANDA

Segundo vários autores, o culto aos mortos na África não separava os eguns (espíritos de mortos) em categorias de “bons” e “maus” da forma como isso ocorreu no Brasil (na expressão máxima do desespero dos escravizados invocando forças para derrubar seus algozes), cujo foco foi o Rio de Janeiro entre os negros bantos que desenvolveram um sistema (chamado vulgarmente Macumba) denominado Quimbanda (do kikongo, “feiticeiro”) dominado pelos Exus. Invocados para o mal (em vez do bem) desde o início, passaram a separar-se cada vez mais da Umbanda, formando Sete Linhas, com Sete Falanges próprias, adotando o sacrifício animal e magia negativa de tal forma  estranho às suas origens que convencionou-se dizer não serem as costumeiras entidades ali presentes mas sim ferozes quiumbas, espíritos sem luz, respondendo nesses trabalhos. Foram tantas as diferenças entre Umbanda e Quimbanda, que seus dirigentes passaram a incorporar a nomenclatura de quimbandeiros, praticantes confessos da magia negativa, com grande aceitação nas capitais e regiões metropolitanas das grandes cidades, aumentando consideravelmente. Particularmente, não aceitamos esse separativismo em nossos dias excluindo os Exus da Umbanda

UMBANDA CRUZADA COM QUIMBANDA

Classificamos assim a tendência atual crescente na maioria das casas de Umbanda que não querem fazerexclusivamente a Umbanda tradicional, permitindo a vinda de Exus de forma controlada. São casas trabalhando com a Umbanda Tradicional em dias escolhidos, tendo sessões de Exu em outros, onde percebemos um rígido controle imposto pelos Caboclos e Pretos-Velhos comandantes dos terreiros. É comum o uso do tradicional uniforme branco nos dias dedicados a outras entidades (algumas casas só usam esse uniforme, outras usam axós) e, nos dias de Exu, é dadas a liberdade de usarem seus uniformes, adereços, maquilagem com moderação. Uma das regras impostas é o uso controlado do álcool quando cada entidade recebe sua porção, não se usando o sacrifício animal e a prática da caridade. Nessas casas os trabalhos costumam ser gratuitos ou cobrados pequenos valores com fins de suprir custos de transporte, gás de cozinha e manutenção do terreiro. Notamos haver, em alguns templos, sessões de desenvolvimento de médiuns destinadas à prepará-los para dar consultas, criar comportamento-padrão nas entidades, desinibi-los, orientá-los; pratica-se o estudo de outras doutrinas e religiões sem conflitos. Em alguns terreiros, pela aproximação à doutrina espírita, há dias dedicados à sessões de desobsessão, ministram aulas dominicais aos jovens, encontros da infância e juventude, cuidado com crianças, entrega de ranchos aos pobres e outros serviços. Não há junto o Culto de Nação e o dirigente é chamado de “cacique”, “diretor espiritual” podendo ou não residir junto ao terreiro, exercendo outras atividades para seu sustento já que não dedica tempo integral à ela. Na frente há “casinha” de Exu (tronqueira), alguns outros tem a “Casa das Almas”, sala de chão batido enterrado fundamentos, dedicadas aos Pretos-Velhos nos fundos. Acreditamos, pela gratuidade dos trabalhos, ser a razão da assistência numerosa e o corpo mediúnico geralmente em torno de vinte médiuns, em média. Estimula-se o diálogo entre médiuns e dirigentes, muito por influência da doutrina espírita, podendo alguns médiuns dirigir setores administrativos do terreiro descentralizando tarefas da figura do cacique. 

UMBANDA TRADICIONAL (“LINHA BRANCA”)

Notamos a gradual extinção dessa modalidade, rareando as casas que mantêm essa tradição. Dizemos infelizmente, porque é uma das mais antigas e tradicionais formas da Umbanda assim estabelecida pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. Muito próxima ao Catolicismo popular e Espiritismo, sobrevivendo seus terreiros às custas de eventuais donativos expontâneos, colaboração dos médiuns e por um quadro de sócios onde inclui-se a assistência. Sob hipótese alguma, não se faz o sacrifício animal. As oferendas costumam ser muito simples dirigidas mais às entidades do que aos Orixás, usando bebidas alcoólicas específicas como item nas mesmas. Alguns Caboclos e Pretos-Velhos costumam beber marafo, cervejas ou vinho em pouca quantidade. Outras casas aproximam-se mais à uma linha “esotérica” abolindo os congás, imagens (usam luzes e cristais), praticando muito o estudo, guardando muita proximidade ao Espiritismo. Alguns terreiros dedicam dias para a Umbanda de Caboclo e Preto-Velho e outros “para mesa branca”, como são chamadas as sessões de cunho espírita. Há o predomínio absoluto do branco nas roupagens assemelhadas aos aventais (jalecos) de médicos, com o nome do médium e o brasão da casa. Não se usa axós (roupas “de baiana”, usadas no Culto de Nação), nem se usa tambor na maioria dos terreiros. Em alguns locais, dá-se passagem aos Exus apenas nos dias de desenvolvimento, ou em portas fechadas, sempre vetado à assistência que desconhece sua presença como trabalhadores. Vêm apenas para limpeza do ambiente, falando pouco. Usa-se pouco álcool nesses dias. Não há “casinha” ou tronqueira de Exu na frente do templo. Algumas têm no fundo uma “casa de firmação” chamada “Casa das Almas” dedicada aos Pretos-Velhos. Entoa-se apenas os tradicionais pontos em português de Caboclos e Pretos-Velhos que dirigem as sessões de caridade. Algumas vezes fazem trabalhos para Povo do Oriente, muito semelhantes às sessões espíritas com a incorporação de “médicos” que dão passes e ministram chás. Nunca uma gira é dirigida por Yori (Crianças) nem, Povo d’Água (considerados Caboclos) exclusivamente, nem há sessões de caridade com essas Falanges. Muito apegada aos Catolicismo, pratica batismos e casamentos muito semelhantes a esses sacramentos. Usa-se o termo “cacique”, diretor espiritual, dirigente para o responsável pelo terreiro (nunca pai ou mãe-de-santo), escolhido para substituir o dirigente anterior falecido, sendo raras as casas regidas pela hereditariedade.  

Nosso Comentário:

Toda a cultura iorubá sempre destaca o valor precioso da vida, sendo a longevidade a maior dádiva dos céus (com ela seria possível a busca de todos os bens e desejos, ter filhos para dar continuidade à família). Essa história, esse festival, perpetuam esses valores e a onipresente providência divina que nunca desampara, na figura do velho a transmitir-lhe sua mensagem.

“É inviolável a liberdade de consciência e de crença sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida na forma da Lei, a proteção aos locais de culto e as suas Liturgias”.

Artigo 5.o Inciso VI da Constituição Federal. “O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.” Artigo 215 Inciso 1.o da Constituição Federal.

 

Axé Motumbá, Mãe Mirian de Oxalá pelos seus ensinamentos.